O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras e instauram a desordem entre os dois campos.
Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem"; próximas, sempre.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

atrasar o relógio/ uma década ou um século/ depois desta meia-noite?






atrasar o relógio
uma década ou um século
depois desta meia-noite?

Preciso do modelo vivo.
Chega o corpo do país.
Preparo as tintas
de cor nenhuma.

Corpo jovem e escuro
coberto de correntes.
Para a carne ou para o ferro
preparo a cor nenhuma?

O modelo vivo treme,
não consegue posar.
Com que tintas se retrata
o tremor que não passa?

O modelo treme e cai.
Do chão, terá a justiça.
Que tintas para pintar
a lei que derruba?

Eis o corpo do futuro:
o primeiro modelo morto.
Como pintar um horizonte
que à penalidade se reduza?

Não o chutaram de lá.
Da justiça, terá o chão.
Eis o modelo para quem
quiser pintar o país.

Escorre um filete do modelo,
mais frio do que o chão,
mais chão do que o frio.

Nele vejo a paleta
toda da cor nenhuma.

anacrônicos, os relógios;
em que década,
em que século estamos
que é sempre meia-noite?

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